Eu geralmente comento diversas pautas polêmicas do Presidente, mas nenhuma me deixou tão estarrecido quando a demissão do Mandetta. Bolsonaro acumula durante toda sua gestão um testamento inteiro de ingerências.
A cada decisão do Bolsonaro, eu me questiono: qual seria o seu objetivo final? Os discursos anticorrupção caíram por terra com as dezenas de acusações a Flavio Bolsonaro em escândalos de lavagem de dinheiro; o discurso de um governo sem ideologia de esquerda foi trocado por uma ideologia negacionista da ciência, cercado por terraplanistas e anti-vacinas, e de extrema direita.
Sua premissa de independência dos ministros técnicos se desmancha com a demissão de Mandetta e diversos outros servidores do segundo escalão, que ousam contrariar a alta soberania intelectual ou tentar brilhar mais que o presidente de ego ferido.
Essa é a demonstração de um presidente que é incapaz de constatar fatos e entender as consequências dos seus atos, vivendo em uma eterna insegurança, com doses de conspiracionismo, sempre caçando inimigos ou soluções milagrosas.
O preço será alto: vidas em risco, economia em frangalhos e retaliações políticas à vista. Mas o maior golpe será sentido pela população, que a cada momento se distancia mais de um presidente que ajudou a eleger.
Hoje, Bolsonaro tem apenas 33% de aprovação, e troca um ministro da Saúde que ostenta 76%. Por mais que ele ainda tenha o poder da caneta, derrotar o Mandetta continua sendo uma de suas vitórias de Pirro: aliados se distanciando, sua base se fragmentando e nenhum reforço vindo no horizonte.