Envolvido com política há mais de duas décadas – primeiro, o pai, e depois, os filhos, além dos parentes que atuam nos bastidores –, o clã dos Bolsonaro é muito mais conhecido pelas constantes trapalhadas do que pelo desenvolvimento de bons trabalhos. Ontem, foi a vez do filho nº 2 soltar suas pérolas: segundo Eduardo Bolsonaro, existe “forte pressão” de feministas para manter meninos e meninas na mesma sala de aula, apesar de existirem “bons argumentos pedagógicos e empíricos” recomendando que haja separação de gênero nas classes. Ele cita dois desses alegados “bons argumentos”: supostamente, 90% das vinte e cinco melhores escolas inglesas seriam “single sex”; ele também relaciona o bom desempenho do Colégio São Bento no ENEM ao fato de que lá só estudam meninos.
Há forte pressão, principalmente das feministas, para que as escolas abriguem na mesma sala meninos e meninas, mesmo havendo bons argumentos pedagógicos e empíricos atuais recomendando o contrário.
Só para citar dois: na Inglaterra mais de 90% das 25 melhores escolas inglesas são ‘single sex’; o mais antigo colégio brasileiro deste tipo, o São Bento (1858) que só aceita garotos, foi o 4º no ENEM 2012.
Acontece que, obviamente, não é assim que a banca toca. Longe disso.
Nossa coluna de hoje, vamos nos dedicar a rebater mais uma das fake news que Eduardo Bolsonaro parece ter orgulho de disseminar.
Meninos e meninas estudando juntos aprendem mais
Embora não existam materiais conclusivos que comparem o desempenho das chamadas “single sex schools” e das escolas mistas, são vários os estudos que demonstram os benefícios da educação mista.
Pesquisadores da Universidade de Bristol descobriram, por exemplo, que meninas que têm irmãos tendem a apresentar maior interesse por esportes e brinquedos que envolvam construção. Além disso, pesquisas também apontam que meninos desenvolvem melhores habilidades de comunicação e de relacionamento com seus pares, bem como apresentam melhor desempenho escolar, quando convivem com meninas.
É por isso mesmo que, indo na contramão da alegação de Eduardo Bolsonaro, o número de single sex schools na Inglaterra caiu de quase 100% da rede, na metade do século passado, para apenas 6%, e as escolas restantes nessa modalidade precisam se reformular diante da drástica queda no número de matrículas.
O machismo diminui o desempenho das meninas, mas segregar não é a solução
As escolas reproduzem estereótipos de gênero tanto quanto qualquer outro espaço. Por essa razão, existe a falsa crença de que meninas tem capacidade intelectual inferior aos meninos nas ciências exatas, e isso é usado como argumento para a separação dos estudantes pelo sexo.
Mas não é bem assim.
Pesquisas apontam que meninos apresentam desempenho escolar geral pior que o das meninas, mas se saem melhor nas ciências exatas. Porém, o desempenho inferior das meninas nas ciências exatas não se dá por questões de intelecto, mas sim por aspectos culturais.
Quando crianças, no 5º ano do ensino fundamental, meninos e meninas apresentam praticamente o mesmo desempenho em Matemática, diferindo em menos de 2 pontos percentuais; mas, ao chegarem no fim do ensino médio, o número de meninos que apresentam bom desempenho na disciplina é quase duas vezes maior do que o número de meninas. De acordo com a OCDE, o comportamento dos pais e professores tem direta ligação com o resultado dos estudantes, já que as meninas relataram ter menos autoconfiança em sua habilidade para resolver problemas de Matemática e eram mais propensas a expressar fortes sentimentos de ansiedade em relação à disciplina, fatores que têm impacto negativo no aprendizado. Quando são comparados estudantes com nível igual de autoconfiança e ansiedade, a desigualdade de resultados entre meninos e meninas desaparece.
Além disso, em países mais igualitários em termos de gênero, não existem discrepâncias significativas no desempenho dos estudantes nas ciências exatas.
O Colégio São Bento não é bom porque só tem homem – é bom porque é caro
Como “evidência” de sua opinião, Eduardo Bolsonaro afirmou que o Colégio São Bento, no Rio de Janeiro, “que só aceita garotos, foi o 4º no ENEM 2012”.
No entanto, a relação de causa e efeito que o parlamentar faz é absolutamente falsa.
Se olharmos o ranking do ENEM de 2015, as dez escolas com a melhor colocação no município do Rio de Janeiro – entre elas o Colégio São Bento – são privadas. A mensalidade do Colégio São Bento para 2019 variava entre R$ 3.939 e R$ 4.138, conforme o nível educacional. A melhor escola pública do município é federal – que, conforme já demonstramos aqui, recebem bem mais investimentos que as escolas municipais e estaduais.
Então, não tem nada a ver com segregação de meninos e meninas. O Colégio São Bento é bom porque a altíssima mensalidade paga por seus alunos permite uma infraestrutura e uma qualidade muitíssimo superior à dos demais colégios.
A conclusão a que podemos chegar é que segregar escolas por gênero não traz benefícios a ninguém. O que vai realmente mudar a educação é o investimento inteligente dos recursos, a consolidação de um plano pedagógico inclusivo e pronto para os desafios de nosso tempo. O que podemos esperar, agora, é que Eduardo Bolsonaro tenha a decência de se retratar e pare de, como seu pai e seus irmãos, achar que faz bonito ao polemizar com mentiras.