Aqueda na arrecadação registrada ao longo de 2017 fez com que o prefeito Marcelo Crivella decidisse limitar os gastos do município nos últimos meses do ano. Nesta segunda-feira, o prefeito publicou um decreto que suspende pagamentos para os fornecedores da prefeitura a partir de 11 de outubro. Já o prazo limite para os órgãos do município emitirem notas de empenho este ano é o dia 4 de outubro.
Em sua justificativa, Crivella cita o artigo 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que prevê restrições ao pagamento de fornecedores se ficar constatado que a arrecadação pode não ser suficiente para o gestor público cumprir as metas de resultado primário ou nominal. A restrição só não atingirá as empresas que forem pagas com recursos “carimbados”, como é o caso de repasses do SUS e do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Parte da verba do Fundeb pode ser empregada, por exemplo, no treinamento de professores.
Também ficam fora da restrição despesas relativa a pagamento de pessoal, encargos sociais e benefícios sociais; pagamento de impostos; juros, encargos e amortização da dívida do município e pagamento de precatórios.
O economista Luiz Mário Behnken, do Fórum Popular do Orçamento, observa que a medida é inedita na prefeitura do Rio. Segundo ele, desde a entrada em vigor da Constituição de 1988, que concedeu maior autonomia financeira para os municípios, essa é a primeira vez que isso acontece no município do Rio. Segundo ele, esse cenário foi de fato provocado pela queda na arrecadação de impostos por causa da crise econômica. Luiz Mário explicou ainda que a medida não impede a prefeitura de promover licitações. Mas assim como os atuais fornecedores, eles só poderão ser pagos em 2018, caso o decreto não seja revisto.
— A realização de grandes eventos na cidade, como a Copa do Mundo e a Olimpíada, ajudaram a retardar um pouco essa queda na arrecadação. Mas agora a situação obrigou o prefeito a restringir as despesas — disse Luiz Mário.
MEDIDA APÓS DIVULGAÇÃO DE BALANÇO
A medida foi tomada cerca de uma semana após a prefeitura divulgar dados preocupantes relacionados aos gastos com pessoal. Na terça-feira passada, um balanço da prefeitura mostrou que no segundo quadrimestre de 2017 as despesas com servidores da ativa, aposentados e pensionistas chegaram a R$ 10,3 bilhões. A soma corresponde a 53,41% da chamada receita corrente líquida (RCL), calculada principalmente com base na arrecadação de tributos. O limite permitido pela LRF é de 54% . Ou seja, a prefeitura ficou a apenas R$ 113,9 milhões do teto. Essa quantia é insuficiente para arcar, por exemplo, com um mês de gastos com servidores (cerca de R$ 800 milhões), sem contar o 13º salário.
— As despesas com pessoal não cresceram significativamente de 2016 para 2017. Esse percentual de 53,41% foi atingido em razão da queda na arrecadação da prefeitura — acrescentou Luiz Mário.
Fontes ligadas à Crivella acrescentaram que a medida também foi tomada para tentar gerar caixa o suficiente para honrar com o pagamento dos servidores até o fim do ano, inclusive o 13º. Segundo o Rio Transparente (portal de acompanhamento da execução orçamentária da prefeitura), o município previu que contaria este ano com R$ 16,6 bilhões em recursos não carimbados.
Até domingo, a arrecadação estava em R$ 10,1 bilhões (60,8% do previsto), faltando pouco mais de três meses para o fim do ano. No caso do ISS (principal imposto arrecado pela prefeitura), a previsão para 2017 é de R$ 6,3 bilhões, sendo que até o momento foram obtidos 3,6 bilhões (57,1% da previsão).
Para a vereadora Teresa Bergher (PSDB), ex-secretária municipal de Assistência Social e Diretos Humanos, a medida pode comprometer a qualidade dos serviços prestados pelo município, porque sem receber, as empresas podem ter dificuldade com o caixa nos últimos meses do ano. Ela lembrou, por exemplo, que boa parte dos profissionais de saúde na rede pública são contratados por intermédio de Organizações Sociais. O mesmo vale para outras pastas, como a própria secretaria de Assistência Social.
O GLOBO tentou falar com representantes da Associação das Empresas Prestadoras de Serviço do Rio (Aeps-RJ), mas foi informado que todos os representantes da entidade estão viajando. A secretaria municipal de Fazenda, por sua vez, divulgou nota em que se limita a explicar os efeitos do decreto.
“A medida é mais uma das ações do município para garantir o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal e pretende evitar eventuais descompassos entre receitas e despesas no final do exercício de 2017. Os empenhos e as liquidações que se utilizam das demais fontes de recursos não serão alcançados pelo decreto. Da mesma forma, o pagamento de pessoal, da dívida pública, bem como as despesas obrigatórias municipais também poderão ter recursos empenhados e liquidados normalmente no sistema do orçamento’’, diz a nota.