No meio da nossa sociedade superinformatizada, tendemos a pensar que o analfabetismo é um problema que ficou no tempo dos nossos avós. Num mundo em que a grande maioria se comunica por mensagens de texto, se informa através de notícias escritas e precisa lidar com contas simples o dia inteiro, temos a impressão de que o analfabetismo ficou pra trás.
No entanto, a realidade é outra. O problema atinge mais de 11 milhões de brasileiros, e é ainda pior se considerarmos os analfabetos funcionais. A cada 10 pessoas, 3 não são capazes de entender e se expressar por meio de letras e números em situações cotidianas com a facilidade devida.
Na coluna de hoje, vamos tratar do sério problema que já deveria ser assunto restrito aos livros de história, mas ainda não é – e está longe de ser.
O Brasil que não sabe ler: o analfabetismo absoluto tem cor e região
De acordo com o IBGE, em 2018 tínhamos 11,3 milhões de analfabetos no país entre as pessoas de 15 anos ou mais – ou seja, 6,8% da população. Na pesquisa anterior, de 2017, essa porcentagem era de 7%, o que significa que somente 121 mil pessoas foram alfabetizadas nesse período.
Um aspecto que salta aos olhos é a discrepância entre as regiões do país. A Região Nordeste tem 4 vezes mais analfabetos do que as Regiões Sudeste e Sul; o Norte, mais que o dobro.
A taxa de alfabetização também é altamente discrepante se compararmos negros e brancos. O número de pretos ou pardos analfabetos é mais que o dobro do número de brancos.
“Eu leio, mas não entendo”: o analfabetismo funcional no Brasil
O número de analfabetos absolutos assusta, mas o de analfabetos funcionais é ainda pior: são 38 milhões de pessoas na situação – ou seja, 3 em cada 10 brasileiros.
O analfabetismo funcional não envolve somente a dificuldade de interpretar textos. O analfabeto funcional também não consegue resolver operações básicas, tampouco identificar a operação matemática a ser aplicada a determinada situação. Esse grupo da população tem dificuldades, por exemplo, na hora de ir às compras, de receber ou dar troco, de entender informações num cartaz ou de absorver o que diz uma notícia de jornal.
O mais surpreendente é que os analfabetos funcionais são cerca de 13% dos concluintes do ensino médio e 4% dos concluintes do ensino superior. Isso significa que a ampliação do acesso à educação não veio acompanhada de qualidade, e a graduação acaba por não ser um sinônimo de inclusão, já que o mercado imporá barreiras aos profissionais que tiverem deficiências dessa natureza. Tampouco frequentar a escola significa estar alfabetizado, já que 70% das crianças saem dos primeiros anos do ensino fundamental sem uma alfabetização efetiva.
Como solucionar o problema
A universalização do ensino básico é extremamente importante para o desenvolvimento do país; mas, desacompanhada de qualidade, as novas escolas tornam-se apenas depósitos de alunos. Colocar a criança na escola é o primeiro passo. É preciso que os professores estejam devidamente qualificados, o acompanhamento pedagógico seja feito com a devida atenção a cada criança e o monitoramento dos resultados seja efetivo e duradouro. Políticas públicas para a educação devem ser sempre pensadas como medida de Estado, e não de Governo; é dizer que as ações de melhoria da educação não podem acabar quando um ciclo de governo se fecha, sob pena de perdermos os avanços.
Além disso, especialistas apontam que há pouco interesse dos governos em concentrar recursos no combate ao analfabetismo, especialmente porque se trata de uma política voltada a um público de maior idade e pouca consciência dos próprios direitos. São poucas as escolas que fornecem a educação de jovens e adultos, o número de vagas é exíguo e os métodos de ensino são atrasados. Assim, além da necessidade da redistribuição e ampliação da rede de ensino de jovens e adultos, é necessário observar que o plano pedagógico a ser seguido para essa população não pode ser o mesmo utilizado para a alfabetização daqueles que o fazem na idade certa.
A solução do problema é complexa, mas executável. A gestão eficiente das políticas públicas é um primeiro passo que já soluciona metade do problema, e melhora a vida de milhares de pesssoas.